"Profunda reestruturação"
Este governo gosta mesmo das profundezas. Primeiro anunciou a necessidade de uma remodelação profunda no INE e agora declara ter realizado uma profunda reestruturação do Ministério da Economia (ME) (ver DL 186/2003 de 20 de Agosto).
Como Carlos Tavares tem sido classificado de reformador "avant la lettre" da AP, chegando mesmo um "opinador" a sentenciar que as reorganizações de outros ministérios teriam de ser comparadas com a do ME, foi com grande expectativa que me "atirei" à leitura da nova lei orgânica.
Recordo que sou partidário da extinção, pelo menos a prazo, deste ministério pois a sua contribuição para o desenvolvimento do país é, no máximo, duvidosa - funções reguladoras, muito bem; funções promotoras, muito mal. Mas as extinções, largamente pré-anunciadas, de numerosos serviços pareciam indicar um movimento no bom sentido.
Começando pelo preâmbulo, a "língua de madeira" provoca alguns arrepios, mas isto é um DL e o articulado é que conta. De qualquer forma as palavras "eficiência", "competitividade", "redundância", "racionalização", etc. são profusamente utilizadas. Peço perdão, mas não consigo deixar de transcrever aqui dois ou três parágrafos desta elucidativa prosa:
"... racionalização e redimensionamento
do sector empresarial do Estado e ... eficiência
da Administração Pública.
Tal implica uma profunda reestruturação dos serviços
que integram o MEc, promovendo-se uma eliminação
dos custos desnecessários resultantes da redundância da
intervenção aos diversos níveis da estrutura institucional,
sem perder de vista o objectivo central de aliviar os
agentes económicos do peso administrativo e burocrático
dos procedimentos, eliminando-se todas as regulamentações
desnecessárias ou redundantes, bem como
de todos os níveis de intervenção da Administração
Pública que sejam dispensáveis, diminuindo-se de forma
muito sensível os tempos de apreciação e decisão.
Os conceitos que perpassam na nova orgânica do
MEc, de dinamização e inovação, regulamentação, regulação
e supervisão da actividade económica, encontram
a sua sustentabilidade em estruturas orgânicas flexíveis
e dinâmicas, que aproximam a economia dos agentes
económicos.
Deste modo, com o objectivo de aproveitar as sinergias
que resultam de um novo modelo organizacional,
promove-se a extinção de um conjunto de serviços, reestruturando-
se outros, de forma a abranger todas as áreas
tidas como necessárias numa intervenção estatal no
domínio da economia.
(...)
A forma como se organizam os serviços, tendo em
conta as diversas áreas de actuação do MEc, centralizando
num único organismo algumas das funções de
administração, como sejam as relacionadas com a gestão
dos recursos humanos, financeiros, patrimoniais e,
ainda, a gestão das tecnologias de informação e comunicação,
constitui um factor não só de modernidade
como, também, de eficiência organizativa, contribuindo
para uma significativa diminuição dos custos de estrutura."
Vamos, agora, ao conteúdo. Tem de se ler e reler porque custa a acreditar, mas entre extinções, redenominações e criações fica tudo mais ou menos na mesma!
Se formos generosos e não contabilizarmos os Conselhos e outras entidades (como a Entidade Gestora de Reservas Estratégicas de Petróleo), o "novo" ME tem exactamente o mesmo número de organismos que o "velho"!
Mas não é só isto, as opções de extinção, criação e reestruturação de organismos são tão "esquisitas" que podem levantar dúvidas sobre a propalada diminuição dos custos de estrutura.
Vejamos alguns exemplos.
É criado um Gabinete de Gestão do ME que vai herdar funções da Secretaria-Geral - essas funções estavam a mais na SG? a SG não as consegue exercer?
O Instituto Geológico e Mineiro é desmantelado, entregando-se um bocado à DG Energia e o outro bocado ao INETI - funções que conviveram bem durante mais de um século, afinal são incompatíveis? ou será que, afinal, Portugal tem petróleo e o melhor é entregá-lo à DGE?
O INETI, com menos currículo que o IGM, afinal não foi extinto e só mudou de nome sem mudar a sigla.
O Gabinete de Estudos e Prospectiva Económica vai passar a chamar-se Gabinete de Estratégia e Estudos - já estavam fartos do papel de carta e queriam um novo? ou é só para mudar o Director-Geral sem ter de dar explicações?
A Agência Portuguesa de Investimento (API) aparece na orgânica como serviço de apoio aos grandes investimentos, mas tendo funções de serviço público normal ou, quanto muito, de instituto público, ganha estatuto "empresarial". Porreiro! E então os outros?
Entretanto IAPMEI e ICEP mantêm-se. Não haverá confusão e sobreposição de funções com a API?
Oh, Carlos Tavares! Isto foi só para "épater le bourgeois"?
Hoje fico por aqui, mas estarei atento aos conselhos que o Conselho para o Desenvolvimento Económico e o Conselho Geral para a Dinamização Empresarial não deixarão de nos dar.
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